Tadeu

Cruzei na rua ontem, por Tadeu Manssus sem que ele percebesse minha presença. Caminhava firme, com passos largos e elegantes como os de um atleta. Magro, cabelos brancos e sem aparência de doente. Tadeu e o segundo filho de um grupo de oito irmãos, cujo alguns mais jovens já se foram. Disse-me certa vez que seu segredo de longevidade era, não trabalhar, comer pouco, caminhar muito e fazer sexo quando o corpo pedir e o outro aceitar.

O menino e a ambulância

A ambulância deslocou-se rápido a o local do acidente. Quando chegou com a sirene meio falha, o menino assustado, disse a sua mãe que a ambulância estava doente. Todos então, riram enquanto atendíamos o homem atropelado!

Laços!

Ando com saudades de muitas coisas; Do peixe assado do Beto, da galinhada noturna na casa de dona Rita, das balistecas e foundes na Teresinha, das comidas diferentes do Rogério, dos papos cabeça de madrugada com a Alba, dos planos de viagem com a Jacque que nunca saíram, das bebidas misturadas da Didi, do papo simples e engraçado com o Abdil regado a vinho barato, dos churrascos em familia na casa da Borba, dos resmungos do Fernando, das gargalhadas do meu filho na seção de humor à tarde na tv, dos pagodes empolgados na casa da Taís. Muita gente não tenho visto por desculpas da falta de tempo, do excesso de trabalho, do cansaço diário. Nenhum motivo deve impedir que se mantenha esses laços tão importantes e fundamentais em nossa vida, vivos.

A escolha certa!

Pela manhã, não foi o relógio biológico que me despertou, mas o telefone celular que mostrava em seu visor a palavra "Privado"e a fréstinha da janela do quarto que prenunciava um belo dia de sol. Mesmo desconfiando de quem pudesse ser a ligação, atendi sem restrições. Estava certo! Era do meu serviço, convidando-me para fazer um plantão extra, o que me recusei por que ja estou no limite de cotas deste mês e também o excesso de plantão extras só me deixa cansado além da conta e engorda os cofres da receita federal. Então tomei meu banho, adiantei meu almoço e fui caminhar na praça. Levei minha agenda de anotações que nem abri e uma esteira onde acomodei-me sob a sombra de uma enorme Paineira de caule grosso e galhos espaçosos que serviam de palco para a fuzarca dos passarinhos. A grama estava aparada e podia-se sentir o cheiro de terra úmida saindo do chão. O sol entrava manso entre as folhas das arvores completando o clima perfeito. Um reduzido numero de pessoas caminhavam por ali naquela hora e isto me provocava a sensação de estar em outro mundo, que me trazia extremo conforto e bem estar. O ruido de alguns veículos que passavam eram tão ínfimos que eu podia contemplar ali, relaxado, toda a sinfonia da natureza à minha disposição, cercando-me por todos os lados. A natureza certamente sobrepõe-se sem limites a tudo e a todos sem exceção. Voltei para casa certo de que hoje, fiz a escolha certa.
Voce está convidado á conhece-la!

O menino sem dente

O menino cruzou por mim com um olhar firme, decidido e um dente protegido numa das mãos estendida. Disse-me que jogaria sobre o telhado para que Deus lhe mandasse um outro bem depressa. Lembrei de imediato que eu também fazia isto quando era criança.

Jesus de resina

Ainda menino, ganhei de minha avó a imagem de Jesus Cristo em resina amarela, do qual muito orei até ficar adulto e achar que não precisava mais dele. Mais tarde dei-o de presente para minha mãe que o colocou em seu santuário. Minha mãe deu-o para meu filho, que deixou-o em seu quarto e não sei o que fará depois...

O filhote

A mulher se apaixonou imediatamente quando viu o filhote deitado entre as coxas quentes de sua mãe numa exposição canina no chopin . Pelos dourados, perninhas curtas, rabinho cotó e aqueles olhinhos marotos, curiosos que pareciam de uma criança inocente! Quis abraço-lo e beija-lo, era o filho que não conseguiu ter. O marido puxou-a pelo braço dizendo entre dentes: Nem pensar!..

O casal Gay

Eu estava sentado no Café do chopin, quando os dois passaram, um com o braço sobre o ombro do outro, mostrando sem nenhum pudor uma relação que sugeria ser mais que uma simples amizade. Desviavam das as pessoas, livres, sem se separarem fisicamente um do outro, despreocupados, despojados, admirando as vitrinas iluminadas sem aquela afetação que se espera dos gays. Não pude deixar de perceber também o sobressalto discreto dos freqüentadores educados que desviavam seus olhares na direção dos dois, sob o conhecido sorrisinho mascarado do preconceito. O vigilante parado de pé próximo da escadaria, até passou disfarçadamente a mão em seu pênis, enquanto esboçava um ar de desaprovação, reforçando para si mesmo sua masculidade. Neste sábado, mais do que tomar uma taça de café expresso, na praça de alimentação do chopin, recebi uma lição rápida e um grande aprendizado, onde percebi todas as nuances cínicas de comportamento moral de uma sociedade hipócrita e escrupulosa, que finge ser moderna somente da boca para fora, que ainda engatinham na sua educada ignorância. Quanto a o casal gay? Só me restou aplaudi-los.
Leia também neste blog: *Exotismo e Obscuridade

Salvador


Salvador então perplexo com todos aqueles sentimentos, buscou sua pedra mágica e colocou-a na altura dos olhos para que lhe desse respostas, lhe indicasse caminhos. Procurava um sinal, um reflexo de luz diferente que lhe tirasse a dúvida, lhe convencesse da verdade, do caminho a seguir. Olhou então para o quadro onde o homem saia do ovo-placenta cinza e ainda assim não viu respostas. Resignado e em silencio, pensou que nem todo o dia era dia de magia. Guardou sua pedra e recolheu-se sob as cobertas quentes de sua cama e a ignorância de um mortal.

Salvador e a pedra

Salvador ganhou da bruxa sua pedra mágica quando ainda era pequeno. No principio não sabia o que fazer com ela, apenas admirava seu brilho, sua cor de um azul incomparável, sua textura lisa, sua resistência frágil, mas aos poucos foi percebendo que o brilho da pedra se modificava quando algo lhe atormentava, quando alguma dúvida lhe açoitava a mente. Ainda duvidoso de seus poderes, guardava-a numa gaveta e vivia sua vida aos tropeços, ora insatisfeito, ora feliz, ora resignado...

Salvador e o sonho

Salvador adormeceu e sonhou que tinha em suas mãos um ovo de galinha do qual quebrava dentro de uma tigela de barro. Sabia que não gostava de ter sonhos, por que estes lhe transportavam para mundos distantes e incomuns, onde era outra pessoa, com novas verdades, outros poderes, outra aparência, forte, sem medos, corajoso, viril, capaz de assumir lutas onde sempre saia-se vencedor. Na cama se agitava violentamente tentando retroceder do sonho, impedir a divisão dos dois seres, um que dormia ali e flutuava abandonando o corpo, que navegava em fantasias mágicas e o outro, que ficava preso ao corpo observando tudo em volta sem muitas vezes ter o que fazer. Tentava acordar-se buscando lembranças do mundo real.
Fazia uma força descomunal, até sentir sua matéria tremer para retornar a o consciente, acordar. Algumas vezes até conseguia. No outro dia, quando despertou, ainda cansado, lembrou assustado daquela luta e de suas aventuras no outro mundo, temendo chegar o momento que não mais pudesse retornar a sua vida imperfeita...

Salvador e a bruxa

A bruxa buscava Salvador, quando este dormia, cansado, quase hipnotizado das rotinas de seus dias normais. Esperava o estagio certo de sua entrega ao sono e então invadia-o sem permissão, induzindo-o a sonhos estranhos, dividindo-o em dois seres; O que segurava sua mão para passeios mágicos e o que ficava na espreita cuidando para que o corpo não se fosse. Voavam sobre telhados e causavam transformações, assumiam lutas e desvendavam mistérios incompreensíveis. Ela sabia que ele era um dos escolhidos e precisava inicia-lo mesmo sabendo de sua resistência, de seu apego as situações comuns de sua paralela vida. Um dia, presenteou-o com uma pedra azul, que dizia ser magia, incomum, oferecida exclusivamente para ele, que era também incomum, na esperança de conduzi-lo a o que ela achava ser inevitável...

A maré

O mar invadiu de repente o calçadão decorado, onde as pessoas caminhavam e dali podiam admirar toda a sua grandeza, o seu poder e beleza. Corroeu por baixo, formando crateras, túneis, expondo raízes; Lambeu por cima roubando os ladrilhos portugueses que enfeitavam o passeio, manchando muros, arrancando flores, arrebentando degraus. Num dia beleza e no outro total destruição. As pessoas atônitas, e com supostas respostas, foram embora arriscando motivos para todo aquele estrago impiedoso.

*Calçadão da praia de Caiobá-PR

Rosito

Rosito era irmão de Joca, marido de Marta, pai de Januaria e morava na Cidade Baixa. Era Jornalista e deficiente físico desde que nasceu. Veraneava no Siriú e cantarolava Caetano Velososo e Tom Zé enquanto molhava os pés na espuma do mar. Disse-me uma vez que sua deficiência incomodava as pessoas por que sua postura dava a impressão de que estava embriagado. Pessoa sensível, culta e sofrida. Tivemos uma amizade intensa e rápida por que nossas vidas mudaram de curso. Muitos anos depois, quando entrei na UTI do Pronto Socorro onde trabalho, encontrei-o deitada em uma cama, com aparelhos na boca. A enfermeira disse-me que tinha sido atropelado. Dias depois quando retornei à UTI, encontrei sua cama ocupada por outro paciente.

Namoro e promessas

Algumas vezes eu ia até o Escaler do Toninho beber alguma coisa e ver pessoas. Conhecia Lauro e Elen de lá:
Lauro que era arquiteto conheceu Elen que era psicóloga, no circo "Escaler Voador". Ele usava batas largas de algodão crú e ela saias compridas de crepe indiano. Namoram-se e apaixoram-se. Lauro prometeu construir uma bela casa para eles. Elen prometeu cura-lo desta doença.

Feitiço

Alguns dias pela manhã tem sido assim: Levantar cedo por força do habito, banho quente, café preto passado direto na caneca, pãozinho francês aquecido no microondas, notbook sobre a mesa da cozinha. Tem dias que amanhece com sol e outros meio nublado, então corro até o quarto para cobri-la melhor, observar seu descanso a distancia, seu sono profundo. Não quero acorda-la, somente observar-la sem fazer ruídos, como um bruxo que rouba traços da alma sem querer mostrar-se.

Maria Conceição

Quando Conceição se turbinava fumando seus (baseados), despia-se por completo ignorando eu e o resto dos moradores. Caminhava pela república completamente solta, nua e despreocupada com quem estivesse a sua volta. Os garotos que moravam nas redondezas competiam entre si, esperando vê-la passar por traz das largas janelas de madeira enquanto cantarolava musicas de Janis Joplin. Conceição namorou Carlos, depois Lídio. Foi mais tarde fazer medicina numa cidade do interior e nunca mais a vi.

Marisa

Marisa e eu desempregados, passávamos as noites inteiras comendo polenta com caldo Knnor e café preto. Falávamos sobre nossas decepções amorosas, nossos medos e fragilidades. As vezes nem dormíamos. Fazíamos de nossos encontros uma psicoterapia de queixas, silencio, gargalhadas e leitura de cartas um dia recebida, um dia escrita e nunca enviadas. Foram dias de tristeza e pobreza passados juntos, ancorados em uma forte amizade e superados pelo tempo. Hoje quando nos encontramos na rua ou na internet, lembramos com certa saudades esses tempos difíceis, mas vividos com intensidade e sentidos como vitória.

AS ROSAS

Enquanto ela caminhava pelos corredores do supermercado, eu escapei de seus olhos e fui até a floricultura encomendar rosas. Escolhi as mais belas e diferentes do balcão. 
Disfarçava de vez em quando para que ela não percebesse minha intenção. Quando as entreguei notei lágrimas de felicidade em seus olhos. Os clientes que passavam surpreendiam-se com as lágrimas e as rosas lilases nunca vistas antes.

O gato


O gato passeia pelo muro do edifico ao lado. Olhar de felino Siamês de um profundo azul que esconde segredos. Sempre nos vigiamos desconfiados. Eu da minha janela que se abre silenciosa e ele de sua rota marcada. Temos missões secretas que jamais confiaremos um a o outro, talvez nem para nós mesmo, animais urbanos.

Enquanto o resgate não chega

Pela manhã quando cheguei em casa após um plantão de 24 horas, não quis deitar para dormir, tomei um banho e sai a procura de gente. Tinha urgência de ver pessoas, que considero amigas. Ver seus rostos, observar seus gestos, ouvir suas vozes. Quando as encontrei, percebi mudanças não tão significativas em algumas delas, mudanças provocadas talvez por suas vidas borradas de pequenos problemas, insatisfações pessoais, estresse do trabalho e algumas pequenas alegrias ditas comum, previamente esperadas... Rimos, bebemos café e até contamos piadas com pouca graça. Voltei para casa menos tenso, e com a sensação de sermos náufragos de um mesmo barco encalhado e na expectativa e esperança de um resgate que demora a chegar, mas que temos um ao outro para nos aliviar enquanto o socorro não chega.

DOLORES DURAN

Eu amava Dolores Duran e tudo que cantava sem nunca te-la conhecido. Imaginava uma mulher com um vestido comportado como era os da época, cantando debruçada sobre uma janela, expondo o seu olhar triste, melancólico, para quem passava na rua.

Depois, por algum tempo, confundia-a com Cacilda Becker a dama do teatro. Somente depois quando esta paixão tendeu a aumentar é que fui em busca de seu rosto estampado em algumas revistas da época. Minha mãe, também fã da cantora, ensaiava dentro de casa, algumas de suas musicas temperando minha sensibilidade musical de criança e seu cansaço pela labuta da vida .

Ione

Ione visitava minha mãe com freqüência e fazia-lhe confidencias com intervalos de lágrimas. Lembro-me de sua tez altiva, e o aroma de seu perfume francês, seus sapatos coloridos combinando com a bolsa elegante, unhas vermelhas e lábios do mesmo ton. Um dia confessou estar grávida, disse que não poderia ter mais um, sacrificar sua vida e a do marido que amava. Precisava resolver o problema inesperado, colocar as gotas numa clinica clandestina oferecida por uma colega do trabalho. Depois disto, nunca mais a vimos, pois foi a ultima coisa que fez.
"Lembrei deste fato ao visitar uma pagina da Internet onde havia uma foto de Eliana Pitman, do qual Ione se parecia".

Beatriz, eu e Vivaldi

De tarde ouvi Vivaldi e suas: Quatro estações enquanto degustava uma taça gigante de cabernet Sauvignon sobre a cama. Lembrei-me que precisava ir até o supermercado pois faltava-me cebolas, batatas e tomates em minha despensa. Pensei que faltava-me também outras coisas, mas não as encontraria em supermercados. A alguns anos a traz, ouvia este mesmo concerto deitado na cama sobre uma colcha de retalhos na casa de Beatriz. Na casa de madeira onde se ouvia também o riacho correr, os pássaros cantarem. Ficávamos longos minutos deitados divagando sobre a vida, viajando dentro dos acordes delicados. Muitos anos se passaram e Vivaldi ainda provoca-me sonhos, Beatriz eu não sei.

Desfecho...em cima

Quando soube, hoje, da morte violenta de meu colega de trabalho num acidente de transito em seu retorno para casa, fiquei imediatamente pensando no desfecho de nossas vidas. Vida que vivemos, que fizemos planos, que amamos, que desperdiçamos, que ora cuidamos, que expomos e que não pensamos que no outro dia podemos perde-la.

Pés sujos, pipa rasgada e lagimas.

Soube da morte de Catatau por outra colega de trabalho, pela manhã, durante um atendimento à um senhor de 53 anos que havia feito uma parada cardíaca em seu domicilio. Enquanto realizávamos manobras de ressuscitação com o paciente deitado a o chão, observava um menino de 9 a 10 anos que se aproximava da porta com o olhar assustado e curioso. Algumas vezes pedíamos para que ele saísse dali, mas ele driblava nossa atenção e voltava a observar tudo, escondido entre frestas espalhadas pela casa de madeira. Quando já por fim, exaustos em nossas tentativas, e  determinado que mais nada poderia ser feito, observei o garoto sentado sobre o muro do pátio, pés encardidos, cabeça baixa olhando para o chão, com uma pipa rasgada entre as mãos e seus olhinhos marejados de lagrimas.

Inês Lanmberthini

Inês me visitou ontem, as pressas, como sempre faz. A principio parecia alegre, bem dispostas logo que chegou, mas aos poucos, a medida que falava sobre sua vida, seus anseios, seus olhos foram perdendo o brilho e uma sombra de tristeza invadiu seu rosto antes iluminado entre um sorriso verdadeiro e outro de disfarce. Percebi sua necessidade de obter respostas das quais não me sentia apto à lhe dar, duvidas em mudar uma vida que acreditava ser feliz, fragilizada por um amor que não parece ser suficiente, perdida em uma paixão que talvez tenha acabado antes mesmo de ter iniciado. Quando foi embora, as pressas, do mesmo jeito com que chegou, me recolhi e fiquei pensando com alguma tristeza do que ela precisava, o que procurava. Então rezei do meu geito para que ela se ilumine e encontre por si só, suas próprias respostas.
"O tempo nos transformará, nos deformará... Este mesmo tempo que nos dá respostas, nos cura, nos mata!"

26/06/2008

O dia hoje, pareceu nascer diferente dos outros dias, feio, cinza, com aquela atmosfera pesada, sem vento, sem nuvens desenhadas no céu. Arvores não dançavam a sinfonia dos ventos, tudo parecendo cena montada de um cinema mudo, fora de ritmo e da ordem natural. As pessoas caminhavam pelas ruas com um ar de aborrecimento, meio sem vida, desanimadas como se nada pudessem fazer para melhorar suas vidas, seu mundo, o clima triste. Depois quando anoiteceu, a chuva começou a cair persistente e tudo ficou deserto, sem movimento com apenas alguns reflexos de luz sobre o asfalto negro.

24/06/2008

O amor é libertário. Não se pode pensar que ele não disponibilize espaços individuais necessários, que ele não pactue confiabilidade e cumplicidade mutua, que ele não regule o equilíbrio nas diferenças que se contrapõe nas relações.
Amar deve ser soltura da alma regada ao prazer da convivência, do desejo. Não consigo conceber um amor que aprisione sob o julgo dos ciúmes, das desconfianças, das insatisfações pessoais somadas e não resolvidas. Por isto amar exige cuidada atenção, paciência e respeito às suas dualidades.

Acho o Eixo

Acontece que se algo esta errado comigo, incomodando-me, tirando-me da rota, trato de reverter imediatamente a situação. Esforço-me para encontrar novamente o eixo que perdi. Se não o encontro, devo pensar e mudar de rota! Mas a rota deve ser uma avenida com palmeiras iluminada pela lua e perfume de rosas lilás como as que entreguei dia 30 de maio em forma de carinho! Por tanto acho o eixo sem Oscho.

Borba me ligou

Minha mãe me telefonou hoje a tarde durante o plantão. Queria saber de mim, ouvir minha voz, saber se já tinha me curado da gripe, se estava me protegendo das noites frias, deste inverno que legalmente ainda não entrou, mas que como dizem os gaúchos: "Já está fazendo um frio de renguear cusco. Lembrou-me entre risos que somos uma familia e por isto, temos de nos ver com freqüência, contar sobre nossos dias, nossas alegrias e também nossas tristezas.

Experiencias do Campo

Quando meu pai foi trabalhar numa fazenda no interior do estado toda minha familia o acompanhou, menos eu. Minha mãe era a cozinheira oficial do grupo de funcionários. Eu fiquei em Porto Alegre com minha tia para não perder o ano letivo. Contava nos dedos o termino das aula para poder estar com eles.
Numa destas férias, quando fui visita-los, eu rolava pelo campo, numa destas brincadeiras enlouquecidas de criança, quando me senti tonto, nauzeado, dor de cabeça, mal estar geral sem saber o que estava me acontecendo. Fui levado para dentro de casa, termometro debaixo do braço, garganta dolorida, não conseguia engolir a saliva.
Quando o estranho médico chegou numa carroça, da vila vizinha, me examinou e sorriu dizendo aliviado: -Doença de criança, cachumba!
Este período, marcou muito minha vida, pois lembro de cada detalhe que vivenciei, das pessoas, do pomar, das galinhas que viviam soltas e dormiam nas arvores e voavam sobre nós a o amanhecer, do deposito de sal que ficava ao lado de nossa casa, o açude fundo onde minha irmã tentou afogar o menino travesso que morava do lado, o carneiro que perseguia minha mãe grávida. A guerra de caquis, os cavalos selvagens, o milho assado no fogão de campanha, os passeios de charrete, o funcionário albino e analfabeto, que não enchergava direito. Os sonhos, os fantasmas, o ruido do vento nas arvores, a triste beleza do entardecer, a simplicidade de tudo. Acho que todos deveriam alguma vez na vida, sentirem a experiência de viver no campo, numa fazenda no interior. Ao menos uma única vez em suas vidas.

Distração Digital

Era um jogo com varias formas geometrias, como triângulos, retângulos, quadrados e outras figuras disponíveis em uma plataforma digital. A missão era formar combinações de tres ou mais figuras iguais formando um numero máximo de pontos. Juro que tentei me distrair, porém, decididamente não é minha praia estes joguinhos de celular.

Heranças

Erika herdou quase todos os móveis e objetos de sua avó morta. Empilhou-os num canto do sótão empoeirado de sua casa, dizendo não saber o que fazer com aquilo tudo. Um dia encontrou entre estes pertences um sapatinho de lã com um papelzinho escrito: “Lembrança de minha querida neta”.

Brincadeiras de criança

Quando pequeno, ajudava minha avó a escolher feijão sobre a mesa de madeira da cozinha. Separava atentamente todos os grãos bons dos ruins, imaginando que eram bois em uma grande estância do interior. Juntava alguns pretos, marrons e malhadinhos e guardava entre meus brinquedos para mais tarde voltar a brincar.

Filha de Ogum

Bel é destas mulheres fortes, bonitas, arranjadas pela vida. De opinião e presença firme. Por si só, é casa cheia, é festa é gargalhadas, bondosa, sincera, corajosa e simples. Tem cabelos longos e crespos jogados nas costa sobre o rosto de marfim, olho que brilha dentro do teu. Fumaça de palheiro, cachaça pura, sem misturas. As vezes fala grosso e não tem medo de nada. Afinal é filha de Ogum!

Caricias roubados

Aos nove ou dez anos de idade, entrava pra dentro do guarda- roupas de minha mãe. Ficava ali enrolando-me em suas roupas de cama, seus casacos, suas toalhas de banho, procurando uma espécie de conforto que não sei explicar bem qual é. Quando ela chegava em casa, cansada do trabalho, eu ficava no meu canto, quieto, tendo a sensação de que tinha feito algo errado mas abraçado-a e beijado-a por horas sem que ela mesma soubesse.

Tarde na praça

Abri a caixa do correio,
homem de farda, gato pardo,
carroça passando,
bicicletas com cachecol,
futebol na praça,
telhados de barro,
criança no balanço,
folhas secas no caminho,
casas velhas de varandas,
mãos nos bolsos,
vigia adormecido ao sol,
vozes de crianças na escola a brincar,
trepar na arvore,
garotos gordos, bochechas rosadas,
bolinhos crús,
fim de tarde,

isto é vida!

Boal

Todos os seres humanos são atores - porque atuam - e espectadores - porque observam. Somos todos "espect-atores" .

Augusto Boal

Augusto.

As vezes penso em quantas pessoas de nosso meio, não conhecemos direito por que ficamos vagando no meio delas em nossos mundinhos, sem observa-las atentamente. Alguns podem ter sido poetas ou loucos e não demos a chance de ouvi-las, observa-las, de saber suas verdadeiras histórias, suas reais verdades. Não abrimos nenhum espaço da nossa atenção.
Tio Dudu era um homem quieto, mas quando falava tinha a voz mansa, pausada e carinhosa com todos nós. Minha mãe conta que na sua juventude, tinha atitudes estranhas. Não falava com ninguem e as vezes sumia no meio do mato por longas horas. Era, as vezes, encontrado deitado de baixo das arvores conversando sozinho, gesticulando, ou olhando pro céu como se buscasse alguma coisa. Quando contraiu câncer de garganta, muitos anos depois, passou a falar ainda menos e seus olhos muito mais.

Dona Dione

Dona Dione fazia seu crochê dia e noite de olhos fechados e testa franzida. Confessou-me certa vez que tinha medo de ficar cega, portanto, tramava suas linhas de olhos fechados para que a vida não lhe causasse mais surpresas.

Oque é ser pobre!

Um pai bem de vida, querendo que seu filho soubesse o que é ser pobre, o levou para passar uns dias com uma familia de camponeses. O menino passou três dias e três noites vivendo no campo. No carro, voltando para a cidade, o pai perguntou:
- Como foi sua experiência?
-Boa, responde o filho, com olhar perdido a distancia.
-E o que você aprendeu? Insistiu o pai. O filho respondeu:
-Primeiro: Que nós temos um cachorro e eles tem quatro;
-Segundo: Que nós temos uma piscina com agua tratada, que chega até a metade do nosso quintal. Eles tem um rio sem fim, de agua cristalina, onde tem peixinhos e outras belezas;
-Terceiro: Que nós importamos lustres do oriente para iluminar nosso jardim, enquanto eles tem as estrelas e a lua para ilumina-los;
-Quarto: Nosso quintal chega até o muro. O deles até o horizonte;
-Quinto: Nós compramos nossa comida, eles cozinham;
-Sexto: Nós ouvimos CDS... Eles ouvem uma perpétua sinfonia de pássaros, periquitos, sapos grilos, e outros animalzinhos... Tudo isso as vezes, acompanhado pelo sonoro canto de um vizinho que trabalha sua terra;
-Sétimo: Nós usamos microondas. Tudo o que eles comem tem o glorioso sabor do fogão à lenha;
-Oitavo: Para nos protegermos vivemos rodeados por um muro, com alarmes... Eles vivem com suas portas abertas, protegidos pela amizade de seus vizinhos;
-Nono: Nós vivemos conectados ao celular, a o computador, à televisão. Eles estão conectados à vida, ao céu, ao sol, ao verde do campo, aos animais, às suas sombras, à sua familia.
O pai ficou impressionado com a profundidade de seu filho e então o filho terminou:
-Obrigado, pai, por ter me ensinado o quanto somos pobres! Cada dia estamos mais pobres de espírito e de observação da natureza, que são as grandes obras de Deus.
Nos preocupamos em ter, ter, ter e cada vez mais ter. Em vez de nos preocuparmos em ser.
autor desconhecido
*Este texto andou vários dias nas mãos de minha mãe; disse-me que não lembrava como chegou até ela. Num almoço de domingo ela deu para mim ler. Prometi que postaria em meu blog.


ENSAIO DE CORES.

Minha agenda está toda rabiscada de idéias, pensamentos soltos, sonhos que não transfiro para ela. As vezes mantenho-a aberta por vários dias aguardando respostas... Respostas que não encontro em mim.
Um dia tudo deixou de ter graça, as piadas, o sorriso das crianças, as peripécias dos filhotes, as cores da vida. Então comecei a exercitar minhas emoções com algumas pinceladas até recuperar tudo de volta, como era antes...

Grandezas

Meu tio queria que eu fosse grande naquilo que ele considerava ser grande. Com o tempo percebi que tínhamos noções de grandezas diferentes na vida . Por um longo tempo essas diferenças nos afastou e então rompemos relações. Só descobri mais tarde quando já não era possível retomar o tempo perdido e estagnar a doença que o levou em poucos meses. Hoje tento ter cuidado com as pessoas que convivo para não reincidir no mesmo erro.

Engrenagem

Quando meu amigo partiu, lembrei o quanto tudo por aqui é provisório. Que partimos sem concluir aquilo que pensamos a que viemos. Deixamos lacunas a serem confiadas e preenchidas por outros que jamais conheceremos, por que partimos antes, sem prévio aviso, sem termos a chance de despedirmo-nos de nós mesmos. Incompletos, naquilo que achamos ser nossa missão, nossos sonhos de realizações, nossa felicidade. Viveremos na memória dos outros, de quem quiser lembrar e um dia também desapareceremos no esquecimento, pela engrenagem da vida, pela substituição que se faz necessária a cada dia que nasce e que morre. Sem culpas, sem responsáveis, apenas regras da vida.

auto confiança?

Meu sobrinho João Victor é distraido. Cruza as ruas para buscar a bola sem olhar para os lados numa confiança cega. Acho que um dia também já fui assim. Hoje fico esperando quem vai me buscar, me estender as mãos para que eu atravesse a rua fora da faixa de segurança com o sinal vermelho aberto e os olhos bem fechados. Quando desconfio da sorte, aguardo o sinal ficar verde e olho para todos os lados!

Magia do céu...

Não lembro de noites tão frias como as deste inverno, talvez tenha tido. Certa manhã, nevou em Viamão. Lembro-me de minha mãe chamando eu e minha irmã para ver os pequenos flocos de algodão gelado caírem do céu magicamente.

As cegonhas...


As cegonhas flutuavam sobre o extenso lago por onde eu passei. Silenciosas, como se fossem de papel. Lembrei que acreditava ter sido trazido ao mundo por uma delas, por encomenda de minha mãe. Tinha duvidas se elas poderiam suportar meu peso enquanto atravessavam as nuvens comigo pendurado a o seu bico rosa.

Cinara...

Tratava Cinara como se fosse filha, embora não fosse. Queria talvez ser o pai que não tive. Eu escolhia suas roupas, seus amigos e até o modo de ver a vida. Em troca, ela matava as aranhas do qual eu tinha medo. Cinara cresceu e brigou por sua liberdade, eu então, perdi o medo de aranhas.

Postagem em destaque

TÔ PENSANDO QUE:

Quando as nossas emoções, alegrias e tristezas passam do tempo, nossos sentimentos humanos ficam acomodados numa cesta do tempo recebendo so...