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Os cantores do muquifo no Partenon

Rodrigo e eu nos encontramos num boteco indicado por ele, para tomarmos umas cervejas e reclamarmos um pouco da vida e do trabalho.
No final optamos por beber vinho, pois o frio desta semana, não estava propicio para beber cerveja. Escolhemos um muquifo sem ventilação, relativamente perto do trabalho, pros lado do Partenon, por que não queríamos gastar muito tempo com deslocamentos e tínhamos pressa de iniciarmos a seção de lamentações, que já tínhamos combinado ha dias, talvez semanas.
Botecos me parecem feitos para isto mesmo, reclamar, chorar, reivindicar, soltar demônios, fazer muito alarde, ao contrario de boates que são para dançar, namorar, encontra um grupo de amigos e fazer a festa. Não se pode fazer lamentações na frente de tantos amigos juntos, com o risco  de sermos corridos. Um muquifo é o lugar certo.
Rodrigo necessitava, muito mais do que eu, falar, então dei-lhe a oportunidade de sair na  frente, o que acabou ele falando muito mais do que eu. Não me senti no prejuízo com isto, ouvi-lo mais, poupou-me de gastar meu discurso repetitivo, mais do que  isto, pareceu promover  meu ego a uma posição mais confortável e de superioridade emocional. Por que tem horas que ouvir é melhor do que falar.
E daaa-le reclamações, insatisfações, discursos sociais e os cambaus.
Depois de algum tempo, Rodrigo levantou da mesa e gritou pro homem atrás do balcão:
_Ferreira, bota aquele CD que eu gosto. Ta com ele ai?
Ferreira desajeitado secou as mãos num pano encardido de gordura de X-burguês e se ajeitou num canto atrás do balcão.
_Este tá bom?
E os três começaram a cantar juntos, Rodrigo, Ferreira e Caetano:
Quando eu chego em casa nada me consola
Você está sempre aflita
Lágrimas nos olhos, de cortar cebola
Você é tão bonita
Você traz a coca-cola eu tomo
Você bota a mesa, eu como, eu como
Eu como, eu como, eu como, Você...
Naquele momento eu percebi que não tínhamos mais do que reclamar, a não ser do inevitável:
_Traz mais vinho Ferreira, a jarra tá vazia!..

Porco Atolado

Na Sexta-feira passada promovi um jantar para amigos em minha casa. Nada de especial, na verdade não é preciso uma data com motivo especial para se receber amigos para jantar, mas é que desde que me mudei para o novo endereço há um ano e três meses que venho prometendo este encontro e termino protelando por razões descabidas. Tinha ideia de fazer um prato de inverno, já que o frio pôr aqui de noite tem nos castigado. Vaca atolada, pensei e que acabei mudando pelo exagerado preço da carne de gado e sua baixa qualidade. Escolhi pôr fazer o prato com carne suína e então mudei o nome para "porco atolado" e com grande sucesso. Na ocasião, ganhei um vidro desenhado e com pimentas de variados tipos e cores que coloquei exposto num local visível na cozinha para que eu me lembre deste encontro carinhoso.

Cântico Negro

É muito bom falar de poesia, ler poesia e recitar as que lembramos ou que nos marcaram de alguma forma no decorrer da vida. Se emocionar e quase chorar nesta cerimonia magica junto com amigos. Fazia tempo que não me jogava neste prazer, envolvido nas palavras de Fernando Pessoa, Vinicius de Moraes e José Régio. 
Fiquei fazendo isto ontem à noite ao lado de duas amigas preciosas, enquanto tomávamos café. Escolhi recitar o poema Cântico Negro do poeta e escritor português José Régio.

Cântico Negro:

Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces

Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se às coisas que pergunto em vão ninguém responde
Porque me me dizeis vós: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,

Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós

Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,

Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é quem me guia, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,

Não me peçam definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

*José Régio- Poemas de Deus e do Diabo-1925


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