Soneto


Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo

Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono

Com que mentira abriste meu segredo
De que romance antigo me roubaste

Com que raio de luz me iluminaste
Quando eu estava bem, morta de medo

Por que não me deixaste adormecida
E me indicaste o mar, com que navio

E me deixaste só, com que saída

Por que desceste ao meu porão sombrio

Com que direito me ensinaste a vida

Quando eu estava bem, morta de frio.

Chico Buarque
Acordei com a cidade encoberta pôr brumas brancas e gelada, de longe avistei palmeiras Reais. Na cama Morgana tinha o olhar pensativo e cantava pra mim:
...Meu mar e minha mãe
Meu medo e meu champagne
Visão do espaço sideral
Onde o que seu sou se afoga
Meu fumo e minha ioga
Você é minha droga
Paixão e carnaval
Meu zem, meu bem, meu mal...

Oque quebrou a gente cola

Dia 16 deste mês minha irmã completa 50 anos, então toda a família esta envolvida em promover um churrasco de comemoração por seu aniversario, que ela jura não dar importância, mas que no fundo sabemos que é um desdem. Meu irmão hoje durante o almoço já rabiscava a lista de convidados e a quantidade de comida e bebida para suprir a festa. Minha família sempre deu importância à comemorações que reúnem amigos e familiares em volta da mesa ou da grelha cantando um sambão e um copo de cerveja na mão. Isto que é referencia de comemoração para eles, mesmo que não estejam alegres, mas ao menos fica aquela sensação de dever cumprido, de que a data não foi esquecida ou passou em brancas nuvens. Não são muito de demonstrar aféto e quando menos se espera surge algum clima de instabilidade que faz com que a relação se quebre mas não se separe os cacos. Passado algum tempo tudo volta a normalidade e como se nada tivesse acontecido, novos encontros ou festas sem uma data comemorativa são marcadas como pretexto de colar o que rachou mas não se espatifou. No meu entender, familia sempre foi uma peça frágil e como diz a letra da musica de Ivete:
♪ ♪...o que quebrou a gente cola, refaz a nossa história de amor..' ♪ ♪
Hoje não revirei gavetas procurando coisas do passado, mas fiquei observando meu presente e em particular o que sobrou de uma relação que parecia tão bonita antes da decisão de acaba-la por razões que envolviam diferenças pessoais, interferência de terceiros e até banalidades que vão sendo liquidificadas com insatisfações maiores e acabam pesando como um pacote único. Tenho conciencia de que rompimentos não terminam em samba e só cicatrizam no decorrer do tempo de cada pessoa... É que tomo um susto quando percebo impessoalidade e distancia, frases que parecem decoradas, cuidadosamente escolhidas parecendo cena de novela onde os diálogos são feitos para satisfazerem o grande publico.

Estrela de Luz própria


Marisa Monte é dessas cantoras que me emociona demais quando vejo-a em raras aparições na TV ou somente ouço cantar. Sua voz e repertório pra mim é da mais alta qualidade e sensibilidade. E sua postura diante da midia me faz acreditar que algumas pessoas nascem estrelas e não precisam de recursos extras para poderem brilhar, portando-se como uma trabalhadora que tem na voz a magia de espalhar delicadamente arte e emoção para quem a ouve. Tenho um infinito e particular apreço pela musica "Vilarejo" que ouvi pela primeira vez na miniserie "A Casa das Sete Mulheres". A letra da musica fala de força, simplicidade e amor que podem revelar sutis diferenças na qualidade de vida e na alma das pessoas quando se permitem ir de encontro a isto.
Há um vilarejo ali
Onde areja um vento bom
Na varanda, quem descansa
Vê o horizonte deitar no chão

Pra acalmar o coração
Lá o mundo tem razão
Terra de heróis, lares de mãe
Paraiso se mudou para lá

Por cima das casas, cal
Frutas em qualquer quintal
Peitos fartos, filhos fortes
Sonho semeando o mundo real

Toda gente cabe lá
Palestina, Shangri-lá
Vem andar e voa
Vem andar e voa
Vem andar e voa

Lá o tempo espera
Lá é primavera
Portas e janelas ficam sempre abertas
Pra sorte entrar

Em todas as mesas, pão
Flores enfeitando
Os caminhos, os vestidos, os destinos
E essa canção

Tem um verdadeiro amor
Para quando você for".

Canção de Amor


Minha mãe cantava esta musica ao pé do meu ouvido, enquanto fazia as lidas da casa, alinhavada com lembranças de sua juventude e desabafos pessoais. Dizia-me que não era feliz no casamento e que muitos sonhos deixou para traz por ter assumido a responsabilidade de criar decentemente a mim e meus irmãos. Cresci e por muito tempo sentia culpa por te-la impedido de voar sobre os mares de sua vida. Hoje eu sei que mesmo sendo uma criança eu era o único disponível para ouvi-la.

Saudade, 
torrente de paixão
Emoção diferente
Que aniquila a vida da gente
Uma dor que eu não sei de onde vem
Deixaste o meu coração vazio
Deixaste a saudade
Ao desprezares aquela amizade
Que nasceu ao chamar-te meu bem
Nas cinzas do meu sonho
Um hino então componho
Sofrendo a desilusão
Que me invade
Canção de amor, saudade

(
Elano de Paula/Chocolate).


Instante

"Eu vou tentar captar o instante já,
Que de tão fugitivo não é mais,
Porque já tornou-se um novo instante.
Cada coisa tem um instante em que ela é.
Eu quero apossar-me do é da coisa.
Eu tenho um pouco de medo.
Medo ainda de me entregar,
Pois o próximo instante é desconhecido..."

Clarisse Lispector.

Lobisomem

Aos 15 anos, eu ficava olhando a lua, admirado com tanta beleza e grandiosidade e me punha perplexo. Em certos momentos pensava que sua luz me induziria a determinados momentos de prazer e tristeza no quase limite da sanidade com a loucura e então revelaria-me o meu pior. Talvez provocasse em mim uma manifestação diabólica e incontrolável e criasse um ser violento e de sedução contida, guardada, chaveada em meu inconsciente com medo de virar lobisomem.
Tenho um fascínio especial pelo vento, maior que as outras manifestações da natureza. Senti-lo bater em meu rosto causa-me uma sensação solitaria de liberdade inexplicável, ouvir seu ruído sobre telhados e janelas um certo conforto aliado a um sentimento de abandono que aconchega, assistir seu movimento ao fazer flutuar papeis e folhas sobre o chão, um momento de magia trazido da infância que não sei se vivi ou criei, é como delirar num sonho acordado. Acredito que este sentimento difícil de compreender, foi marcado em minha vida por algum momento passado cuja a sensibilidade ea fragilidade estavam a flor da pele e que hoje não encontro respostas que o defina. Na verdade tantas coisas não tenho resposta e muito menos sei definir das minhas emoções como gostaria.
Sexta-feira quase no final do plantão de doze horas, socorri um jovem de 15 anos, na Quinta do Portal-Lomba do Pinheiro, que dirigia uma motocicleta e atropelou um menino de 6 anos. Seu pai, angustiado e preocupado com o menino (atropelado) que ja havia sido removido por outra ambulancia e também com o estado de saúde do filho(atropelador), dizia para o garoto enquanto segurava-lhe a mão e beijava-o afetuosamente:
_Filho, a partir de hoje quero que tu seja padrinho deste menino que tu atropelastes. Quero que tu o visite todos os dias e se responsabilize pela recuperação emocional dele. Esta será a tua missão de agora em diante. Uma obrigação que assumirás em agradecimento a bênção que vocês receberam por estarem vivos!_ Dizia.
Fiquei ouvindo em silencio, surpreso e feliz com as palavras deste pai e sua atitude de conciência e respeito pela vida.

Augusto de Boal

Morreu ontem Augusto de Boal, diretor, dramaturgo e intelectual carioca do subúrbio da Penha aos 78 anos, vitima de insuficiência respiratória. Boal foi um dos expoentes de transformação no panorama teatral dos anos 60, frente ao Teatro de Arena.


"Todas as sociedades humanas são espetaculares no seu cotidiano, e produzem espetáculos em momentos especiais. São espetaculares como forma de organização social, e produzem espetáculos como este que vocês vieram ver. Mesmo quando inconscientes, as relações humanas são estruturadas em forma teatral: o uso do espaço, a linguagem do corpo, a escolha das palavras e a modulação das vozes, o confronto de ideias e paixões, tudo que fazemos no palco fazemos sempre em nossas vidas: nós somos teatro! Não só casamentos e funerais são espetáculos, mas também os rituais cotidianos que, por sua familiaridade, não nos chegam à consciência. Não só pompas, mas também o café da manhã e os bons-dias, tímidos namoros e grandes conflitos passionais, uma sessão do Senado ou uma reunião diplomática --tudo é teatro. Uma das principais funções da nossa arte é tornar conscientes esses espetáculos da vida diária onde os atores são os próprios espectadores, o palco é a plateia e a plateia, palco. Somos todos artistas: fazendo teatro, aprendemos a ver aquilo que nos salta aos olhos, mas que somos incapazes de ver tão habituados estamos apenas a olhar. O que nos é familiar torna-se invisível: fazer teatro, ao contrário, ilumina o palco da nossa vida cotidiana. Em setembro do ano passado fomos surpreendidos por uma revelação teatral: nós, que pensávamos viver em um mundo seguro apesar das guerras, genocídios, hecatombes e torturas que aconteciam, sim, mas longe de nós em países distantes e selvagens, nós vivíamos seguros com nosso dinheiro guardado em um banco respeitável ou nas mãos de um honesto corretor da Bolsa --nós fomos informados de que esse dinheiro não existia, era virtual, feia ficção de alguns economistas que não eram ficção, nem eram seguros, nem respeitáveis. Tudo não passava de mau teatro com triste enredo, onde poucos ganhavam muito e muitos perdiam tudo. Políticos dos países ricos fecharam-se em reuniões secretas e de lá saíram com soluções mágicas. Nós, vítimas de suas decisões, continuamos espectadores sentados na última fila das galerias. Vinte anos atrás, eu dirigi Fedra de Racine, no Rio de Janeiro. O cenário era pobre; no chão, peles de vaca; em volta, bambus. Antes de começar o espetáculo, eu dizia aos meus atores: - 'Agora acabou a ficção que fazemos no dia-a-dia. Quando cruzarem esses bambus, lá no palco, nenhum de vocês tem o direito de mentir. Teatro é a Verdade Escondida'. Vendo o mundo além das aparências, vemos opressores e oprimidos em todas as sociedades, etnias, gêneros, classes e castas, vemos o mundo injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo porque sabemos que outro mundo é possível. Mas cabe a nós construí-lo com nossas mãos entrando em cena, no palco e na vida. Assistam ao espetáculo que vai começar; depois, em suas casas com seus amigos, façam suas peças vocês mesmos e vejam o que jamais puderam ver: aquilo que salta aos olhos. Teatro não pode ser apenas um evento, é forma de vida! Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!"

*Discurso feito por Boal em 27/03/2009 em homenagem ao dia do Teatro, quando foi nomeado embaixador do teatro pela Unesco.

Eu poderia escrever meus textos no editor do blog e ali mesmo corrigi-los e publica-los depois com segurança, mas tenho o vício antigo de ainda rabiscar minhas idéias sobre pedaços papel que encontro e que vou guardando em gavetas, armários, estantes e pastas, causando-me a sensação de que mesmo perdendo-os ficarão guardados, eternizados.
Penso que mexer em gavetas resuscita fantasmas, amores e histórias guardadas, já quase apagadas, quase esquecidas na lembrança. Encontrei um retrato de tio Nestor, (era assim que toda a família chamava o irmão de minha avó, padrinho de meu irmão e que vivia só).
Era educado e bem empregado, gentil e feminino.
Ganhava buquês de rosas vermelhas em seus aniversários. Falava sempre no grande amor que sentia pela irmã que morreu jovem de tuberculose. Nunca se casou, nunca teve filhos e passou toda a sua vida ganhando afilhados e lembrando deste amor, que alguns da familia acreditavam envergonhados, ser incestuoso.



De que gosto e de que não gosto? Me perguntei dia desses enquanto folhava uma revista de viagens onde ilustrava lugares paradisíacos para o descanso das ferias. Algumas perguntas que faço a mim mesmo as vezes me toma de surpresa. Gosto de tantas coisas, pensei comigo mesmo, mas outras gosto mais ou então menos que algumas. Acho que as que gosto menos, foi as que aprendi a gostar em função de outras pessoas ou situações que de alguma forma me obrigaram a ter um olhar ou sabor diferente daquilo que antes sentia. Tipo influência. Lembro-me que grande parte da minha vida, não tomava cerveja. Achava-a amarga e quando insistia em bebe-la tinha a sensação desagradável de ficar estufado e desconfortável. Depois de algum tempo, saindo para bares noturnos pela cidade é que passei a me acostumar com a bebida gelada e saborea-la com amigos mais sedentos. A o contrario, o vinho sempre foi a minha predileção, embora tenha as minhas exigências.
Mas enquanto olhava a revista onde mostrava praias belíssimas, em lugares onde sempre é verão, lembrei-me da dificuldade que tenho de me manter exposto a o Sol. Não que não goste de sol, mas a combinação de sal, sol, areia e calor ardendo o corpo me é perfeitamente dispensável, quanto a ficar espremido sob os minúsculo centímetros de sombra de um guarda-sol. Quando se trata do ar das montanhas, serra e lugares aconchegante em que se posso tomar um banho de água doce e ficar de baixo da sombra acolhedora de alguma árvore daí é perfeito. Acho que no decorre da vida, vamos fazendo adaptações em função de nos socializarmos com o próprio meio, com as pessoas, os amigos, a família e o que recebemos de informações dizendo-nos que é bom. Aderimos a gostos e prazeres que nem sempre é o nosso, mas dos outros e assim fica aquela sensação de um gostar, porém de menos.

Samu em ação

Reuniões, reuniões e mais reuniões. É o que mais vejo fazerem durante todo este tempo em que trabalho no serviço público e particularmente no SAMU há mais de dez anos. Há cerca um mês atras, novas reuniões para discutir as novas metas da nova administração e seu novo projeto de gerenciamento juntou em volta da mesa chefes e subordinados. Na ocasião regras já conhecidas foram mantidas e novas estabelecidas. Sei de toda a dificuldade encontrada de se fazer mudanças no Serviço público, assim como conheço o caráter da atual gerente e responsável técnica, sua seriedade e de seu empenho em corrigir os erros que vem prejudicando bom andamento do serviço todos estes anos. Mas a experiência vivida de outras administrações e a convivência com situações rotineiras ainda vigentes me deixa ainda inseguro e descrente quanto a viabilidade de proceder alguma mudança significativa na melhora do serviço. Lembro-me de certa vez ter mencionado numa das tantas reuniões que já participei sobre a humanização do serviço dentro do ambiente de trabalho e a mudança de regras que se faz necessária junto a regulação medica e seus dispositivos de ação. Não acredito que mudanças possam surtir efeito com normas e supervisão dirigidas apenas para o trabalhador da linha de frente sem que seja criada também aos que ficam atras da mesa tomando decisões. O funcionamento da maquina operacional hoje é complexa e ineficiente pôr falta de dispositivos administrativos que crie uma linha funcional de trabalho, organizado, competente e humanizado, sem que haja respeito e confiança entre as diferentes categorias que compõem o serviço. Quanto ao excesso de reuniões, sei que é cansativo mas também uma formas acertada de se puxar discussão e entendimento entre os interessados em algum mudança.
Ontem o dia foi muito cansativo, tirando grande parte da minha energia. Dormi tarde e acordei muito cedo pensando numa provável sexta-feira agitada. Esqueci-me que era feriado e então pulei da cama acreditando num agenda cheia de compromissos chatos que é 'pagar contas'.
Fiquei sem telefone celular, que depois de várias semanas dando sinais de mal funcionamento parou por completo. Sinto-me parcialmente incomunicável e ansioso, por vezes irritado e lembrando do homem que atendi ontem, véspera do Dia do Trabalhador, e que morreu diante dos meus olhos, soterrado sob um deslizamento de terra sem que eu pudesse fazer muita coisa. Foram horas de tensão, estresse, dor e sofrimento e por fim a sensação incomoda de impotência, de que nada poderia ser feito.

O beijo na calçada

Durante os minutos em que o semáforo estava vermelho percebi que a atenção dos motoristas estava voltada para a calçada. Todas as cabeças viradas num único sentido, alguns com expressão de surpresa, de timidez e até de indignação, como se estivessem sendo obrigados a assistir aquela cena de exposição calorosamente intima e obscena. Tratava-se de um jovem casal aos beijos na calçada, sem se importarem com oque acontecia a sua volta. Um prolongado beijo diante de um tráfego apressado e barulhento. Uma cena atípica sob a claridade do dia e a sombra de olhares preconceituosos, sob os olhos de quem tem presa e desaprova tamanha demostração de afeto e amor.

A DOUTRINA SECRETA


Estou de posse do Livro "A doutrina Secreta" de Madame Blawastki, que em outra ocasião já esteve em minhas mãos e não li. Fico dividido entre a curiosidade de seu conteúdo e a falta de paciência de ler um assunto tão complexo quanto ciência, misticismo e religião. A obra original foi publicada em 1888. Segundo Blavatsky, a origem e evolução do homem é descrita em pergaminhos muito antigos, chamados de Estâncias de Dzyan, os quais ela teria tido acesso e teria estudado. Segundo esta teoria, o Homem físico surgiu há 18 milhões de anos a partir de seu molde astral, formando-se então a Raça que ela chama de Atlante. Para Blavatsky os primatas superiores são antigas raças humanas que se degeneraram, e daí se explica as semelhanças fisiológicas entre ambos. Blavatsky não nega a teoria da evolução, porém não acredita que uma força "cega e sem objetivo" possa ter criado o homem. Para ela, a criação do homem foi guiada pelas hierarquias divinas a partir de um plano..

Blavatsky afirmava ter tido experiências místicas desde a infância e passou a viajar pelo mundo em busca de conhecimento espiritual e esotérico. Durante suas viagens, ela afirmou ter passado algum tempo no Tibete, onde teria tido contato com mestres espirituais e aprendido ensinamentos secretos.
Helena era uma talentosa pianista e, segundo várias testemunhas, era dotada de poderes psíquicos ou sobrenaturais.
A vida de Blavatsky foi muito polêmica, entre brigas com amigos teósofos como Olcott, além de várias acusações de charlatanismo, pois adorava se exibir como dotada de poderes psíquicos, algumas vezes usando de fraude, como algumas pessoas comprovaram, o que não é, necessariamente, uma negação das faculdades espirituais

Cântico Negro

É muito bom falar de poesia, ler poesia e recitar as que lembramos ou que nos marcaram de alguma forma no decorrer da vida. Se emocionar e quase chorar nesta cerimonia magica junto com amigos. Fazia tempo que não me jogava neste prazer, envolvido nas palavras de Fernando Pessoa, Vinicius de Moraes e José Régio. 
Fiquei fazendo isto ontem à noite ao lado de duas amigas preciosas, enquanto tomávamos café. Escolhi recitar o poema Cântico Negro do poeta e escritor português José Régio.

Cântico Negro:

Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces

Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se às coisas que pergunto em vão ninguém responde
Porque me me dizeis vós: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,

Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós

Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,

Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é quem me guia, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,

Não me peçam definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

*José Régio- Poemas de Deus e do Diabo-1925


Sônia me disse que ela e Luiz, encontraram meu sósia quando foram à Natal. Fiquei curioso para conhecer uma pessoa que se parece tanto comigo, em traços, gestos e expressão ao falar. Prometeu mandar-me seu Orkut, Msn, ou endereço de e'mail para eu me surpreender tanto quanto eles. Lembrei-me que muitos anos atrás eu tinha certo receio de cruzar por algum lugar e encontrar alguém que fosse muito parecido comigo, como um irmão gêmeo, uma espécie de clone.

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TÔ PENSANDO QUE:

Quando as nossas emoções, alegrias e tristezas passam do tempo, nossos sentimentos humanos ficam acomodados numa cesta do tempo recebendo so...