O gato


O gato passeia pelo muro do edifico ao lado. Olhar de felino Siamês de um profundo azul que esconde segredos. Sempre nos vigiamos desconfiados. Eu da minha janela que se abre silenciosa e ele de sua rota marcada. Temos missões secretas que jamais confiaremos um a o outro, talvez nem para nós mesmo, animais urbanos.

Enquanto o resgate não chega

Pela manhã quando cheguei em casa após um plantão de 24 horas, não quis deitar para dormir, tomei um banho e sai a procura de gente. Tinha urgência de ver pessoas, que considero amigas. Ver seus rostos, observar seus gestos, ouvir suas vozes. Quando as encontrei, percebi mudanças não tão significativas em algumas delas, mudanças provocadas talvez por suas vidas borradas de pequenos problemas, insatisfações pessoais, estresse do trabalho e algumas pequenas alegrias ditas comum, previamente esperadas... Rimos, bebemos café e até contamos piadas com pouca graça. Voltei para casa menos tenso, e com a sensação de sermos náufragos de um mesmo barco encalhado e na expectativa e esperança de um resgate que demora a chegar, mas que temos um ao outro para nos aliviar enquanto o socorro não chega.

DOLORES DURAN

Eu amava Dolores Duran e tudo que cantava sem nunca te-la conhecido. Imaginava uma mulher com um vestido comportado como era os da época, cantando debruçada sobre uma janela, expondo o seu olhar triste, melancólico, para quem passava na rua.

Depois, por algum tempo, confundia-a com Cacilda Becker a dama do teatro. Somente depois quando esta paixão tendeu a aumentar é que fui em busca de seu rosto estampado em algumas revistas da época. Minha mãe, também fã da cantora, ensaiava dentro de casa, algumas de suas musicas temperando minha sensibilidade musical de criança e seu cansaço pela labuta da vida .

Ione

Ione visitava minha mãe com freqüência e fazia-lhe confidencias com intervalos de lágrimas. Lembro-me de sua tez altiva, e o aroma de seu perfume francês, seus sapatos coloridos combinando com a bolsa elegante, unhas vermelhas e lábios do mesmo ton. Um dia confessou estar grávida, disse que não poderia ter mais um, sacrificar sua vida e a do marido que amava. Precisava resolver o problema inesperado, colocar as gotas numa clinica clandestina oferecida por uma colega do trabalho. Depois disto, nunca mais a vimos, pois foi a ultima coisa que fez.
"Lembrei deste fato ao visitar uma pagina da Internet onde havia uma foto de Eliana Pitman, do qual Ione se parecia".

Beatriz, eu e Vivaldi

De tarde ouvi Vivaldi e suas: Quatro estações enquanto degustava uma taça gigante de cabernet Sauvignon sobre a cama. Lembrei-me que precisava ir até o supermercado pois faltava-me cebolas, batatas e tomates em minha despensa. Pensei que faltava-me também outras coisas, mas não as encontraria em supermercados. A alguns anos a traz, ouvia este mesmo concerto deitado na cama sobre uma colcha de retalhos na casa de Beatriz. Na casa de madeira onde se ouvia também o riacho correr, os pássaros cantarem. Ficávamos longos minutos deitados divagando sobre a vida, viajando dentro dos acordes delicados. Muitos anos se passaram e Vivaldi ainda provoca-me sonhos, Beatriz eu não sei.

Desfecho...em cima

Quando soube, hoje, da morte violenta de meu colega de trabalho num acidente de transito em seu retorno para casa, fiquei imediatamente pensando no desfecho de nossas vidas. Vida que vivemos, que fizemos planos, que amamos, que desperdiçamos, que ora cuidamos, que expomos e que não pensamos que no outro dia podemos perde-la.

Pés sujos, pipa rasgada e lagimas.

Soube da morte de Catatau por outra colega de trabalho, pela manhã, durante um atendimento à um senhor de 53 anos que havia feito uma parada cardíaca em seu domicilio. Enquanto realizávamos manobras de ressuscitação com o paciente deitado a o chão, observava um menino de 9 a 10 anos que se aproximava da porta com o olhar assustado e curioso. Algumas vezes pedíamos para que ele saísse dali, mas ele driblava nossa atenção e voltava a observar tudo, escondido entre frestas espalhadas pela casa de madeira. Quando já por fim, exaustos em nossas tentativas, e  determinado que mais nada poderia ser feito, observei o garoto sentado sobre o muro do pátio, pés encardidos, cabeça baixa olhando para o chão, com uma pipa rasgada entre as mãos e seus olhinhos marejados de lagrimas.

Inês Lanmberthini

Inês me visitou ontem, as pressas, como sempre faz. A principio parecia alegre, bem dispostas logo que chegou, mas aos poucos, a medida que falava sobre sua vida, seus anseios, seus olhos foram perdendo o brilho e uma sombra de tristeza invadiu seu rosto antes iluminado entre um sorriso verdadeiro e outro de disfarce. Percebi sua necessidade de obter respostas das quais não me sentia apto à lhe dar, duvidas em mudar uma vida que acreditava ser feliz, fragilizada por um amor que não parece ser suficiente, perdida em uma paixão que talvez tenha acabado antes mesmo de ter iniciado. Quando foi embora, as pressas, do mesmo jeito com que chegou, me recolhi e fiquei pensando com alguma tristeza do que ela precisava, o que procurava. Então rezei do meu geito para que ela se ilumine e encontre por si só, suas próprias respostas.
"O tempo nos transformará, nos deformará... Este mesmo tempo que nos dá respostas, nos cura, nos mata!"

26/06/2008

O dia hoje, pareceu nascer diferente dos outros dias, feio, cinza, com aquela atmosfera pesada, sem vento, sem nuvens desenhadas no céu. Arvores não dançavam a sinfonia dos ventos, tudo parecendo cena montada de um cinema mudo, fora de ritmo e da ordem natural. As pessoas caminhavam pelas ruas com um ar de aborrecimento, meio sem vida, desanimadas como se nada pudessem fazer para melhorar suas vidas, seu mundo, o clima triste. Depois quando anoiteceu, a chuva começou a cair persistente e tudo ficou deserto, sem movimento com apenas alguns reflexos de luz sobre o asfalto negro.

24/06/2008

O amor é libertário. Não se pode pensar que ele não disponibilize espaços individuais necessários, que ele não pactue confiabilidade e cumplicidade mutua, que ele não regule o equilíbrio nas diferenças que se contrapõe nas relações.
Amar deve ser soltura da alma regada ao prazer da convivência, do desejo. Não consigo conceber um amor que aprisione sob o julgo dos ciúmes, das desconfianças, das insatisfações pessoais somadas e não resolvidas. Por isto amar exige cuidada atenção, paciência e respeito às suas dualidades.

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Quando as nossas emoções, alegrias e tristezas passam do tempo, nossos sentimentos humanos ficam acomodados numa cesta do tempo recebendo so...