A DANÇA DA LAGRIMA

A lagrima lhe caiu do olho e foi descendo pelos frisos do rosto até o canto da boca, como se tivesse vida própria. Seguiu dançando livre como Isadora, sobre o pescoço, a caminho dos seios, atravessou a barriga e umbigo, onde definitivamente parou, formando uma poça salgada.
Há certos balés da vida, que não admitem testemunhas oculares!.. Isto só é possível perceber com muita atenção e olhos fechados.

VINGANÇAS INOCENTES.

Sentia algumas vezes, que era alvo de pequenas e ardilosas vinganças, promovidas por algumas pessoas, mas daquelas vinganças sutis e disfarçadas de atitudes inocentes, cujo o objetivo não era o de destruir, mas de jogos de força ou alguma lição silenciosa de perspicaz intendimento.
Surgiam a o acaso, em doses pequenas, que  em certos momentos pareciam não ferir, mas noutros, surtir um angustiante sentimento de culpa a ser tratado.
Seria por tudo o que não deu certo e pelo tempo que foi perdido?
Já havia experimentado isto, com outras pessoas, o que o fazia repensar sobre te-las do seu lado, no pouco que lhe restava de vida.

OBJETO DE AZAR

Semana passada o corpo de um jovem assassinado, foi encontrado na calçada da rua do lado. Os vizinhos todos comentavam nas redes sociais aterrorizados com a violência que começa a chegar na porta de suas casas. Talvez a vitima não tivesse sido morto ali, mas noutro lugar e depois desovado na rua escura, que muitos passam e temem por assaltos.


Dos pertences da vitima, sobrou um par de tênis, esquecido, jogado na calçada, que ninguém tem coragem de descartado-lo num saco de lixo. Ficou meio que amaldiçoado, um objeto que pode atrair coisas negativas. Sei lá o que as pessoas pensam. 



MARAS, VALE SAGRADO DOS INCAS.


Maras é uma cidade que parece um vilarejo no Vale Sagrado dos Incas, no Peru, a 40 quilômetros ao norte de Cusco. A cidade é conhecida por suas lagoas de evaporação de sal, suas casas e a igreja,  que parecem uma grande escultura de argila vermelha feitas à mão, perfiladas em ruas estreitas da mesma cor. 


As pessoas que nela vivem, são de aspecto simples e te observam como se tu viesse de um planeta distante, até cumprimenta-las com um simples movimento de cabeça ou um sorriso de simpatia. Não puxam conversa a toa, mas respondem expressivamente ao primeiro contato.
Idosos sentados na calçada, crianças com trajes típicos ou uniformes escolares, desfilam pelas ruas empoeiradas dando seguimento a suas rotinas.
Maras te reporta a solidão de viver num lugar parado no tempo e de beleza impar. É também o caminho para as Salinas de mesmo nome e o sitio arqueológico Moray, uma especie de estação de experimentação agrícola, até hoje não comprovada.

FÚCSIA.

Abriu a porta e saiu sem dar explicações de onde ia, caminhava na ponta dos pés, pelo corredor do edifício, como se não quisesse chamar a atenção. 
Cruzou a rua parecendo em fuga e foi de encontro a ele, que não tinha rosto dentro do carro de janelas escuras.
Da sacada, alguns curiosos a observavam silenciosos, o que parecia ser o seu mais recente segredo.

PRENÚNCIOS DA NATUREZA.

Um vento brando movimentava as arvores daqui, perto de casa, numa tarde ensolarada, em que homens gritavam em suas praticas esportivas, crianças corriam e cachorros latiam. De repente o vento soprou mais forte fazendo com que as arvores se inclinassem mais do que o normal. Delas saíram pequenas partículas flutuantes, que ao se aproximarem dos meus olhos, percebi tratarem-se de plumas de pássaros que levitavam no ar, indo para o leste. Os pássaros começaram a voar de todos os lados alvoroçados.
Este deve ser um acontecimento corriqueiro da natureza, que quase não percebemos, porque nossos olhos estão voltados para dentro, à espera de outras transformações, pensei. A desatenção,  nos faz perder certos prenúncios ocasionais de mudança. A chuva caiu impiedosa, minutos depois, parecendo que iria acabar com o mundo.

CUIDADOS REDOBRADOS.

Por alguns instantes, percebeu-se entrando em zona de conflito interno, que inúmeras vezes não conseguia controlar, disfarçar. Iniciava com uma certa tensão, que ia tomando-lhe o espaço até não conseguir mais respirar, deixando-o em completa desordem.
Longe de casa, do seu mundo particular, afastado de amigos, que lhe proporcionavam algum conforto e segurança, era possível relaxar, se mostrar e até cantarolar alto, errando as letras; Mas ali, cercado daqueles estranhos cordiais, cheios de sorrisos e gentilezas, não era possível ser ele mesmo e mergulhar em voos rasantes de suas verdades, era necessário redobrar cuidados e atenção, inclusive de si mesmo para não se trair.

PRENUNCIO DE DIAS PIORES


Às vezes, perdia-se de si, esquecia quem era e pra onde estava indo. Não reconhecia as pessoas, as ruas, os prédios, os cheiros que compunha a cidade, agora transformada num mundo estranho a sua volta. 
Perdia o norte e ficava girando feito uma bussola desorientada, ate encontrar um refúgio, uma porta fechada, uma parede que lhe parecesse sólida, para também apoiar-se e esticar as costas tensas que doía.
Forçava por alguns momentos, lembrar-se do objetivo que tinha, quando levantou da cama tão certa de si, trocou de roupa e ganhou a rua de cabelos soltos, boca pintada, com algum propósito debaixo do braço e uma certa apreensão contida.
Era somente disto que lembrava?..
Desconfiava que estava a beira de um colapso, pois não era possível aqueles esquecimentos repentinos, que a despersonalizava, deixando um grande vazio da sua existência e preenchidos pelo barulho desenfreado da cidade.
As pessoas olhavam-na como se percebessem que algo estava errado.
Sua cabeça girava e transformava suas lembranças num monte de pó, a se perder no vácuo.
Algo de pior estava por vir, pensava apreensiva enquanto caminhava sem rumo. Os esquecimentos eram algum prenuncio de dias muito piores a lhe surpreender.

DUETO DE CORDAS.


Quando ele passou distraído, sem perceber que estava sendo vigiado, ela escondeu-se entre os eucaliptos sem perde-lo de vista. Pensou consigo mesma, enquanto observava-o se distanciar:
Homens tem o caminhar firme e um cheiro próprio de homem que não conseguimos definir. Pele áspera, pelos que arranham na hora do carinho.
Reproduzem um som de violoncelo quando estão parindo poesia a o seu modo, em nossos ouvidos.
Dão-nos uma certa dor que temos que suportar quando se entregam e mostram seus segredos de dominação natural.
Pra nós, fica a habilidosa tarefa de tocar violinos sem desafinar a musica.

CONVITE INOPORTUNO.

Logo agora que eu não tenho força para subir montanhas.
Olhos para enxergar o horizonte.
Agilidade nos braços para nadar em teu lago, 
que me estendes a mão, num convite simpático?
Ah, este convite demorou demais.
Mais do que a própria vida. 
Envelheceu os anseios e chegou tarde demais...
Agora quero voar  nestes céus que inventei 
e descansar na fragilidade das nuvens. 
Caminhar na beira dos abismos, sem medo de cair.
E se acontecer de cair, saio por aí voando.
Planando.
Levitando na minha própria sorte.
Esta mesma, que te tornou distante...

SOMBRA DISTORCIDA.


Por aqui, nada de novo acontece é somente eu, eu e eu, de cara estampada nas manchetes da minha imaginação e que vou alimentando com argumentos vil, para me penalizar, me vitimar, me tornar impotente, vulnerável e sem forças.
Aprendi a bater de frente com desencontros, a tropeçar em duvidas. 
Me perco, me acho, me escondo, me excluo de toda a culpa, de todas as responsabilidades pra não mostrar minhas fraquezas.
Me transformo num disco arranhado repetindo sempre a mesma coisa: Eu, eu e somente eu, a buscar-me, a achar-me, a desencontrar-me, a perceber que tudo é o mesmo, que nada mudou e que não tenho nenhuma estratégia eficiente para sair desta angustia.
Sou uma sombra distorcida como muitos, disputando um pedacinho de luz.

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