Por que faço eu sempre o que não queria?
Que destino contínuo se passa em mim na treva?
Que parte de mim, que eu desconheço, é que me guia?

O meu destino tem um sentido e tem um jeito,
A minha vida segue uma rota e uma escala
Mas o consciente de mim é o esboço imperfeito
Daquilo que faço e sou: não me iguala

Não me compreendo nem no que, compreeendendo, faço.
Não atinjo o fim ao que faço pensando num fim.
É diferente do que é o prazer ou a dor que abraço.
Passo, mas comigo não passa um eu que há em mim.

Quem sou, senhor, na tua treva e no teu fumo?
Além da minha alma, que outra alma há na minha?
Por que me destes o sentimento de um rumo,
Se o rumo que busco não busco, se em mim nada caminha

Senão com um uso não meu dos meus passos, senão
Com um destino escondido de mim nos meus atos?
Para que sou consciente se a consciência é uma ilusão?
Que sou entre quê e os fatos?

Fechai-me os olhos, toldai-me a vista da alma!
Ó ilusões! Se eu nada sei de mim e da vida,
Ao menos eu goze esse nada, sem fé, mas com calma,
Ao menos durma viver, como uma praia esquecida..."

Fernando Pessoa
(1888-1935)

Gaita de boca

Existe uma gaita de boca que toca aqui por perto e me chama atenção. Impede-me que eu durma antes das quatro da manhã. Este blue vindo da gaita parece um choro, um lamento que atravessa as paredes na madrugada chuvosa. Não é sempre que toca, é somente quando quer, tem vontade própria, chora quando quer despertar algo na alma, nas noites de chuva como a de hoje.
Semana passada, alguém de Casimiro de Abreu, visitou meu blog fazendo eu reviver com saudades a visita que fiz a esta cidade em Fevereiro, quando fui ao Rio. Casimiro de Abreu, é uma pequena e pacata cidade encrostada entre a serra e o mar. Possui uma beleza interiorana peculiar. Um lugar difícil de se esquecer!

Domingo no Brique

Dar um passeada hoje pelo Brique, foi tão necessário quanto experimentar um bolinho de bacalhau ou um acarajé com suco natural na banca de comidas baianas da Célia. Dia quente, sol, pessoas com roupas leves, cuia de chimarão e garrafa térmica penduradas no ombro, suco natural, gente diferente e colorida, poesia de rua, estátua humana, musica clássica acompanhada por violoncelo, show de crianças indígenas, exposição de artesanato, artes plásticas, antiguidades, pessoas caminhando pelo parque, outras deitadas sob a sombra das árvores, crianças banhando-se nos chafarizes, terceira passeata Lésbicas de PoA, tirar fotografia com o ultimo lambe-lambe. O Brique vai além de uma simples feira, comparado mundialmente ao Mercado das Pulgas de Paris e a Feira de San Telmo em Buenos Aires. É palco de espetáculos artísticos, tribunas politicas e sociais, encontro de amigos, e um recanto onde os Portoalegrenses podem se aproximarem ainda mais da alma de sua cidade e se distraírem.

Sobre a Vitória Régia

Acordei deitado sobre uma Vitória Regia, incrivelmente sem afundar. O rio era límpido e transparente e refletia o Sol na sua superfície como um grande espelho dourado. Uma brisa soprava de leve e me conduzia para algum lugar rio abaixo. Será que é assim o paraiso, pensei logo que acordei sobre a minha cama!...

Situações banais

Hoje a noite vesti-me de bermuda, camiseta sem manga, chinelos Havaianas e dei uma longa caminhada pelas calçadas do bairro. Pulei uma grande pedra branca que avistei na calçada e que nunca a tinha notado, conversei com o vigilante bigodudo da rua, com Cleide a dona do bar, comprei uma garrafa pequena de cerveja escura que bebi ainda na rua com prazer e uma lâmpada de 100 watts. Dei duas voltas na praça iluminada onde acontecia uma partida de futebol, senti cheiro de mato, notei que a lua estava pela metade, ouvi Marisa Monte num carro estacionado com um casal se beijando. Desviei do feitiço com a vela acesa na esquina, ouvi uma piada nova do sindico que saia e as queixas da moradora de cima que não conseguia fazer seu carro ligar. Avistei um cavalo solto e assustado correndo pelas ruas, Quero-queros barulhentos defendendo seu espaço... Percebi que se pode fazer tantas "histórias" com estas situações banais, como viver mais um dia dentro delas e comprender a sua importancia!..


Pendengas da cidadania

Então foi decidido dia 23 de Agosto a pendenga do SIM ou NÃO, pelo projeto de transformação do Pontal do Estaleiro Só na beira do Guaiba, em prédios altos de moradia chic (economicamente diferenciado) e comerciais. A construção de um complexo de prédios na área do antigo Estaleiro levantou os moradores de Porto Alegre numa poeira de discussões no que se refere aos impactos positivos e negativos no local. Segundo o projeto seriam construídos seis gigantescos prédios na orla do Guaiba. Os jornais e meios de comunicação fomentaram a opinião publica durante semanas para saberem junto aos cidadões, se deviam ou não ser construídos os prédios residenciais. Atualmente a área é um amontoado de construções em ruínas, matagal e lixo, transformado-se dia a dia em um mega lixão, ponto de marginais e violência. Me senti inseguro de escolher por um SIM na ocasião e com isto dar aval a uma pequena fatia da sociedade que teria acesso visual a um dos locais mais belos da cidade quando se aproximassem de suas janelas. Me senti um favorecedor da minoria se na ocasião optasse por um SIM. Por outro lado pensei que medida o governo tomaria com relação aquela área, caso vencesse o NÃO e o projeto de construção ficasse apenas no papel, continuaria o lixão de sempre?.. Existe algum projeto do governo para aproveitamento publico daquela área, será que entrará no complexo jogo das impossibilidade orçamentarias? Venceu o NÃO e agora só nos resta esperar como temos esperado pelo projeto de Revitalização do Cais do Porto, o projeto de reforma da Ponte do Guaiba e tantos outros que nem lembro mais por caírem em esquecimento.

Em que momento perdemos a inocência?

_De que são feita as estrelas?
Perguntou a senhora para a menina de cinco anos que eu atendi ontem.
_De pedacinhos de espelho!
_E as nuvens?
_De algodão!
_E o planeta Terra?
_De gente feliz!
_E a noite?
_É quando eu fecho os olhos para dormir!
E a senhora continuava a perguntar insistentemente para a menina que era uma candura e respondia a tudo espontâneamente e com a certeza de seus conceitos inocentes, imaginativos e olhar sonhador.
Fiquei pensando de que mundo vinha aquela doce criaturinha e em que momento mudamos nossos conceitos pessoais pelos conceitos do mundo e das regras impostas. Em que momento somos obrigados a crescer e perdermos a inocência para sobreviver nesta guerra e virarmos adultos, em que momento?

Beirando desconforto

Por mais que eu corresse e empurrasse o pé contra o acelerador e fixasse meus olhos para ver os traços luminosos no asfalto escuro da avenida Ipiranga, eu sentia que precisava ir com mais presa ainda, com mais vontade, com mais urgência de chegar em casa e me atirar sobre a cama e ficar em minha companhia, quieto. As vezes fico assim, somente eu me suporto, somente eu posso encontrar minha posição de conforto, somente eu posso escapar de mim e me encontrar de novo. Desconfortos algumas vezes nos fazem retomar novas posições emocionais diante de nós mesmos, abre possibilidades a futuros recomeços intrínsecos. Uma pausa, ponto, nova linha, travessão, reiniciar e traçar novos caminhos...

Caixa de Pandora

Como não tens mais escrito, tenho a sensação de que perdi algo em ti que não sei o que é, que não tenho quando estou do teu lado, te olhando no olho, bebendo vinho, sentindo tua respiração lenta e profunda. Acho que algo que impactava com minhas ideias e me deixava pensando e que não se revela nos encontros pessoais. Clico na porta que se abre e nada de novo alem do azul e da musica que se repete. O que tens feito de tuas inspirações, o que tens pensado solitariamente que não revelas mais, o que tens guardado em tua caixa de Pandora?


Dia de Verão

Acordei com o sol invadindo o quarto e alguns raios batendo no meu rosto. Dia bonito e com ruídos identificáveis que me dão a sensação de há vida lá fora além da minha aqui neste quadrado organizado. Parece aqueles dias que antecedem viagens-> decisões-> mudanças-> e que a vida te dá algumas pistas discretas a serem percebidas nas coisas mais óbvias. Um canto diferente de pássaro na árvore, choro de criança na calçada, alguém apertando a campanhia do apartamento vizinho. Tudo tão absolutamente normal, mas diferente de outros dias em que o silencio é maior e tão espaçoso quanto o mar, incomodo como uma cela apertada, em que percebo minha própria respiração se fazer audível nas imensas ondas de silencio que algumas vezes me faz bem, noutras mal e tem dominado os dias frios e chuvosos daqui. Talvés a diferença esteja em mim e não neste dia que parece um Verão um tanto esquecido.

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Quando as nossas emoções, alegrias e tristezas passam do tempo, nossos sentimentos humanos ficam acomodados numa cesta do tempo recebendo so...