O GRANDE URSO CHAMADO NITAMARA

Certa noite, uma mulher, engoliu um grande urso. Sem saber ao certo se era sonho ou fantasia da sua imaginação, tentou esquecer daquele fato bizarro e levar a sua vida normal, ate que percebeu, que com o passar do tempo, foi adquirindo certos hábitos e desejos que lhe despertavam uma força, que jamais tivera antes.
Às vezes lembrava em rápidos lampejos, daquilo que parecia um sonho incomum, mas sonhos eram apenas sonhos, porque desperta-los?..
Mas o grande urso engolido, usando de sua inteligencia e força, disfarçado no corpo de tão frágil mulher, decidiu despertar e caçar alguns homens que estavam perdidos na floresta das sombras. 
Juntou-os num mesmo lugar, livres e sem trancas e lhes deu um espaço onde pudessem criar, reconhecer suas almas e assim expulsar seus próprios demônios.
E esses homens então, ainda tímidos, desconfiados, começaram a cantar e a tocar chocalhos como índios, a dançarem em círculos feito galinhas, a declamarem  poesias como Castro Alves, nos seus manifestos abolicionistas.
O que parecia uma desordem, virou uma festa, uma reflexão, uma contestação, uma revolução.
Tambores e cânticos eram ouvidos a uma longa distancia, por outros homens que se aproximavam curiosos.
Há de se pensar nestes homens resgatados, como uma provação e na floresta das sombras como uma prisão e o urso a libertação.
A frágil mulher, talvez desconhecesse que seu nome Nita, que lhe fora dado ao nascer, significava grande urso e Mara, desordem, guerra, revolução.

Este texto é uma homenagem a uma das incentivadoras da cultura em Viamão. Niltamara. Nita: Significa grande urso. Mara: guerra, desordem, revolução.

CANTIGA DE NINAR.


Solidão era uma poeira leve, que lhe cobria a cara. E quando o mundo girava, jogava em seu colo pedaços irregulares de sofrimentos, que adormeciam em seus braços, feito crianças frágeis e abandonadas.
Às vezes seu olhar se distanciava para as mais profundas incertezas. Mas o mundo lhe confidenciava segredos, com a mesma brutalidade que lhe arrancava pedaços. 


AS TRAPASSAS DA MORTE.

A morte observava-o a vários meses, mantendo um discreto sigilo. Vigiava tudo o que ele fazia, seguia seus passos, lia seus pensamentos e às vezes até deitava do seu lado, quando chegava do trabalho  e se jogava na cama morto de cansado .
Pensava em levá-lo mesmo sem qualquer justificativa e gozando de boa saúde.
Mas aquela espinha que lhe sairá no rosto, na semana passada, talvez rendesse um bom motivo...

NO TEMPO DAS EXPECTATIVAS.

O olhar dela para ele, não era só de admiração, mas de uma grande expectativa e de um possível namoro promissor, com fantásticas experiencias inovadoras a serem descobertas juntos.
Sempre que podia, corria ao seu encontro, disponibilizando tempo e atenção.
O olhar dele era fugitivo e rebatia em paredes vazias, como quem tinha dúvidas se seguia em frente numa aventura de pouco interesse e futuro incerto.
Ela imaginava horas e horas de papo cabeça sobre os lençóis úmidos pelo entardecer da madrugada. 
Ele queria apenas ficar sozinho e comer bergamotas ao Sol do outro dia.

O MISTÉRIO DAS JANELAS

Carregava dentro de si o mistério das janelas que se abriam e se fechavam para o mundo. Isto era para ele, muito significativo. Janelas velhas, coloridas, quebradas, desgastadas pelo tempo, lhe chamavam a atenção de uma forma peculiar e por vezes incompreensível.
Em cada uma, um mistério a ser revelado, uma historia a ser contada, talvez um segredo a ser mantido com as tampas fechadas.
Em criança, queria saber o que se escondia por traz delas, depois de algum tempo, o que acontecia do lado de fora. Janelas lhe pareciam, um portal de descobertas a serem desvendadas.

IRMÃS GÊMEAS.

A verdade e a mentira são como duas irmãs gêmeas atraentes e com suas antagônicas personalidades, que se completam sobre as atitudes e inclinações humanas.
Que desconhecida força, lhes dão tamanho poder?
A verdade tem suas pequenas mentiras camufladas...
A mentira, algumas verdades saborosas...

O VOO DO DRAGÃO.

Ele ficava sempre ali, na mesma esquina, a mostra, aguardando eu passar, como um dragão pronto para me rasgar a pele, lamber meus ossos, me devorar.
Algumas vezes ficava pendurado num andaime, entrelaçado em cordas, disfarçado com um uniforme, um capacete de proteção, para que eu, de longe, percebesse seu jogo, suas atrevidas investidas, seu olhar de fogo que me vigiava, que tentava buscar o meu ainda assustado, inibido, preocupado de ser ferozmente aniquilado.
O medo me consumia, mas algo em mim, já havia sido dominado, pois não conseguia desviar a rota. Fazia o mesmo trajeto, tremula, sentindo seu fogo chegar em mim, me queimar as coxas, o ventre, até terminar-me em cinzas.
Quando enfim nos encontramos, pude sentir que estava perdida. Sua pele áspera, suas garras que me marcavam as costas, seu abraço forte de dragão que me envolvia, me fizeram voar sobre os continentes mais distantes.

POEMA PARA SÔNIA.

Com Sônia, os amigos cantam, dançam e declamam poesia.
Sua alegria se transforma em energia, se espalha, contagia.
Na casa de Sônia os pássaros adormecem nos entre laços de uma trepadeira.
Parece besteira, rotineira.
Coisas de feiticeira.
Seus olhos falam e encantam.
E quando canta:
De seus lábios escorrem boleros, fados, samba-canções.
Sônia é mais que poesia é alegria e dedicação.
Mesmo na contramão.
Nas ruas sombrias de Viamão
Onde se ouve suas canções
É o rodopio dos piões, que descobrem uma nova direção.
É o mistério dos pássaros que gorjeiam na vertical.
É sensacional.
É as páginas de um livro,  que a brisa decidiu revelar,
sem nada ocultar, perpetuar.
Sônia é arte.
É estandarte.
É a sabedoria do coração.
É vibração.
A mais pura emoção.



NOITE DE MACUMBA.

De longe, ouço um sino tocar com delicadeza em meu coração.
Na noite escura, mulheres com saias rodadas e coloridas, surgem cantando e acedendo velas. Também depositam tigelas de barro enfeitadas, na esquina vazia.
Parece haver uma festa com farta comida e bebida.
A estas horas da madrugada, poucos veículos circulam e os que passam, andam de vagar ou tentam desviar sua rota.
Gritos e sussurros, é ouvido.
A esquina vira um mundo, fora deste mundo.
Os que caminham por perto, desavisados, se sentem temerosos com o que poderão ver ou sentir, nestas noites em que coisas invisíveis estão a solta na esquina.

CRONOGRAMA DE ATIVIDADES.

Um jovem caminha na rua, com uma grande mochila presa nas costas. 
Ele vai ou vem de algum lugar... 
Do outro lado da rua, um idoso, com seu cão de estimação preso a uma guia, caminha no sentido contrario. 
Ele vai ou vem de algum lugar...
Eles se cruzam sem nada dizer um a o outro.
Eles vão ou vêm de algum lugar...
Isto cria alguns pontos de vista neste texto, que não cabem explicações, mas que levam para algum lugar... 
Será que isto tem alguma significação importante, alem de um cronograma de atividades?
Tudo vai ou vem de algum lugar.

ALMAS GÊMEAS.

Existem algumas facetas minhas impregnadas em ti, que ao te encontrar por acaso, ou não, percebo no teu olhar, nos teus gestos, nas tuas atitudes mais cruas. São pedaços de mim, da minha carne, dos meus ossos e nervos espalhados em ti, feito um remendo costurado com finas artérias, que pulsam e reagem aos incômodos da alma que também parece minha.
Dores, alegrias, inevitavelmente compartilhadas em corpos diferentes, mas cuja a alma se parecem similares, noutros momentos tão desiguais.
Alguns atitudes tuas, me levam a embriagues da alegria, outras a uma certa angustia natural de quem se vê e carrega certas culpas que não são de nossa inteira responsabilidade.
Beijar-te, é beijar a mim mesmo no espelho, com certa estranheza. Contrariar-te é dar as costas ao que sou.

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TÔ PENSANDO QUE:

Quando as nossas emoções, alegrias e tristezas passam do tempo, nossos sentimentos humanos ficam acomodados numa cesta do tempo recebendo so...