COMO DIZ LEILA DINIZ.



Acordei as dez horas da manhã, com o sol batendo em minha janela, depois fui caminhar pelas calçadas, na praça a poucos metros de minha casa, observando o movimento das arvores, sentindo o vento forte e frio congelar meu rosto. Engraçado, mas enquanto caminhava, sentia que esta cena, já havia acontecido antes comigo, a muito tempo a traz. Apesar de estar bem abrigado, com calça grossa e casacos de lã, o frio conseguia ultrapassar todas as camadas de roupas e me atingir os ossos. Num determinado momento, durante minha caminhada, fui transportado mentalmente para outro lugar, outro período de minha vida onde lembrei da cena que parecia se repetir.
Era 14 de Julho de1972, quando saia para rua numa manhã como a de hoje e ouvi no rádio de pilhas de um amigo a noticia da queda de um avião na Índia sem sobreviventes. Entre as vitimas, uma brasileira conhecida, a atriz Leila Diniz. Isto já faz quase 36 anos e eu na época tinha apenas 14 anos. Lembro-me de ter ficado estarrecido com a noticia e ter chorado o resto da manhã. Pra mim era impossível não lembrar daquela mulher alegre, bonita e despojada e que foi fotografada grávida, de biquíni numa praia do Rio de Janeiro. A mulher que quando aparecia na tv, minha mãe trocava de canal, por ser muito desbocada. Quando retornei para minha casa, depois do passeio, sentei-me na frente do computador e resolvi saber mais sobre sua vida. Revitalizar lembranças que as vezes ficam meio apagadas pelo tempo. Pensei também que no dia que soube de sua morte ventava forte e fazia sol, como hoje.
Leila formou-se em magistério e foi ser professora do jardim de infância no subúrbio carioca. Aos dezessete anos de idade, conheceu o seu primeiro amor, o cineasta Domingos de Oliveira e casou-se com ele. O relacionamento durou apenas três anos. Foi nesse momento que surgiu a oportunidade de trabalhar como atriz. Primeiro estreou no teatro e logo depois passou a trabalhar na TV Globo, do Rio, fazendo telenovelas. Mais tarde, casou-se com o moçambicano e diretor de cinema Ruy Guerra, com quem teve uma filha, Janaína.
Participou de catorze filmes, doze telenovelas e muitas peças teatrais. Ganhou na Austrália o premio de melhor atriz com o filme Mãos Vazias
Leila Diniz quebrou tabus de uma época em que a repressão dominava o Brasil, escandalizou ao exibir a sua gravidez de biquíni na praia, e chocou o país inteiro ao proferir a frase: Transo de manhã, de tarde e de noite. Ganhou o título de A grávida do ano no programa do Chacrinha.
Era uma mulher à frente de seu tempo, ousada e que detestava convenções. Foi invejada e criticada pela sociedade machista das décadas de 1960 e 1970. Era malvista pela direita opressora, diva amada pela esquerda ultra-radical e tida como vulgar pelas mulheres da época.
Além de ser jovem e bonita, Leila era uma mulher de atitude. Falava de sua vida pessoal sem nenhum tipo de vergonha ou constrangimento. Concedeu diversas entrevistas marcantes à imprensa, mas a que causou um grande furor no país foi a entrevista que deu ao jornal O Pasquim em 1969. Nessa entrevista, ela, a cada trecho, falava palavrões que eram substituídos por asteriscos, e ainda disse: Você pode muito bem amar uma pessoa e ir para cama com outra. Já aconteceu comigo.
O exemplar mais vendido do jornal foi justamente esse onde houve a publicação da entrevista da atriz fluminense. E foi também depois dessa publicação que foi instaurada a censura prévia à imprensa, mais conhecida como Decreto Leila Diniz. Perseguida pelo polícia política. Alegando razões morais, a TV Globo, do Rio de Janeiro, não renova o contrato de atriz. Leila ficou escondida no sítio do colega de trabalho e apresentador Flávio Cavalcanti, se tornando jurada do seu programa, no momento em que é acusada de ter ajudado militantes de esquerda.
Meses depois, Leila reabilita o teatro de revista, e começa uma curta e bem sucedida carreira de vedete. Estrelando a peça Tem banana na banda, improvisando a partir dos textos escritos por Millôr Fernandes, Luiz Carlos Maciel, José Wilker e Oduvaldo Viana Filho. Recebe de Virgínia Lane o título de Rainha das Vedetes. No carnaval de 1971, é eleita Rainha da Banda de Ipanema por Albino Pinheiro e seus companheiros.
Morreu num acidente aéreo, da Japan Airlines, no dia 14 de julho de 1972, aos 27 anos, no auge da fama, quando voltava de uma viagem feita para a Austrália.
Sua amiga, a atriz Marieta Severo e o compositor e cantor Chico Buarque de Hollanda cuidaram da filha de Leila Diniz e Ruy Guerra, durante muito tempo; até o pai da criança ter condições de assumir a filha, Janaína.
Um primo e advogado se dirigiu a Nova Délhi, na Índia, local do desastre, para tratar dos restos mortais da atriz. Acabou encontrando um diário onde continha diversas anotações e uma última frase, que provavelmente estava se referindo ao acidente: "Está acontecendo alguma coisa muito es...."
Leila Diniz, A Mulher de Ipanema, defensora do amor livre e do prazer sexual é sempre lembrada como símbolo da revolução feminina , que rompeu conceitos e tabus por meio de suas idéias e atitudes.

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